O jornal O Dia publicou, na edição de hoje (20), o artigo “Para que o Direito?”, escrito pelo juiz João Batista Damasceno, da 1ª Vara de Órfãos e Sucessões da Capital. No texto, o magistrado aborda o papel da Justiça no impasse sobre o destino do Museu do Índio. “A ministra Cármen Lúcia, em decisão suspendendo a Lei dos Royalties, disse: ‘E se uma vez se desobedece a Constituição em nome de uma necessidade, outra poderá ser a inobservância em nome de outra. Até o dia em que não haverá mais Constituição’. A citação cai como uma luva para o papel que o Judiciário desempenha em relação aos direitos dos índios que ocupam o antigo Museu do Índio há quase sete anos. Seus direitos são desconsiderados em nome da necessidade de se realizar um campeonato de futebol”, escreve o juiz.
Leia abaixo a íntegra do artigo:
Para que o Direito
A ministra Cármen Lúcia, em decisão suspendendo a Lei dos Royalties, disse: “E se uma vez se desobedece a Constituição em nome de uma necessidade, outra poderá ser a inobservância em nome de outra. Até o dia em que não haverá mais Constituição”. A citação cai como uma luva para o papel que o Judiciário desempenha em relação aos direitos dos índios que ocupam o antigo Museu do Índio há quase sete anos. Seus direitos são desconsiderados em nome da necessidade de se realizar um campeonato de futebol. As liminares deferidas, em ações coletivas, na primeira instância da Justiça Federal foram suspensas pela presidenta do Tribunal Regional Federal, e as deferidas em ações possessórias, movidas individualmente perante a Justiça Estadual, foram suspensas pela presidenta do Tribunal de Justiça.
O estado recorreu à presidenta do Tribunal de Justiça alegando que o prédio é da União Federal, que ameaça desabar, que a Fifa exigiu sua demolição e que os processos deveriam ser remetidos para a Justiça Federal. Mensagem, acompanhada de documentos, remetida à presidenta do Tribunal de Justiça do Rio narrando que laudo atesta a solidez da estrutura do prédio; que a Fifa nega haver solicitado a demolição do prédio; que o prédio está relacionado à história da política indigenista no Brasil; que a propriedade é de pessoa jurídica de direito privado, a Conab, e que a turbação é feita pelo Estado do Rio, donde a competência é da Justiça Estadual, não mereceu resposta. A presidenta do Tribunal de Justiça “atendeu a pedido do governo do estado” e suspendeu a eficácia das liminares que reconheciam os direitos possessórios dos índios e determinou a remessa dos feitos para a Justiça Federal.
Hoje encerra o prazo dado por um juiz federal para a desocupação voluntária. Ante resistência, o governador deve mandar o Batalhão de Choque para a desocupação forçada. Se houver violência contra os indígenas o governador poderá ser responsabilizado pelo sangue, mas também a Justiça.
João Batista Damasceno é doutor em Ciência Política pela UFF e juiz de Direito. Membro da Associação Juízes para a Democracia
Fonte: Assessoria de Imprensa da Amaerj